sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A pena de morte para os moradores de rua

Fabíola ou Neguinha, de aproximadamente 30 anos, foi assassinada com dois tiros (tórax e abdômen) numa calçada da Avenida Bruxelas, no Jardim Novo Mundo, em Goiânia, na madrugada do dia 3 deste mês. Ela é a 33ª vítima da violência contra os moradores de rua na Capital desde agosto do ano passado e foi encontrada sem vida ao lado de um cachimbo de crack e uma garrafa de bebida alcoólica.



Fabíola “foi a segunda moradora de rua assassinada só na semana passada. Ela era acostumada a passar o dia com um grupo de andarilhos que perambulavam na região leste da Capital, entre a Praça da Bíblia, no setor leste Vila Nova e a linha de trem, no Jardim Novo Mundo”. O assassinato de Fabíola “está dentro de um contexto em que moradores de rua na Capital têm sofrido ataques constantemente, a tiros, a pedradas e a pauladas”. Tem-se a impressão que, na prática, foi decretada a pena de morte para os moradores de rua. Uma verdadeira barbárie!



José Eduardo da Silva, assistente social e assessor de direitos humanos do município de Goiânia e da Coordenação do Comitê Intersetorial de Políticas Municipais para a População de Rua, anunciou que “em meio a mais uma onda de assassinatos na Grande Goiânia, a Prefeitura vai lançar, em 90 dias, um sistema de proteção à pessoas em situação de rua”. Reparem: em 90 dias. O município não percebe que se trata de urgência urgentíssima? Por que tanta demora? Será, mais uma vez, uma conversa fiada?



Maria Madalena Patrício de Almeida, da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia, afirma que “o número de vítimas pode ser bem maior, já que ela perdeu o contato com muitos moradores de rua, após o início das execuções em série”. Ela “cobra ações pontuais para a elucidação dos crimes”. Tudo indica que se trata realmente de um grupo de extermínio.



Diante da omissão do Poder Público (municipal e estadual) e de sua incapacidade (ou, falta de vontade política) de resolver o problema, a Pastoral dos Povos de Rua – como afirma Maria Madalena – defende que “a investigação desses crimes deve ser federalizada.”



A respeito disso, apareceu uma luz no final do túnel. “Uma proposta de federalização das investigações de aproximadamente 40 homicídios cometidos no Estado está em análise pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). O pedido é de autoria da Procuradoria-Geral da República” (O Popular, 04/08/13, p. 03). A esperança sempre se renova e nunca morre!



Domingo (11), deste mês, fiquei tomado de indignação, lendo a seguinte notícia: “Será realizado na manhã do dia 10 de setembro o primeiro júri popular do acusado de matar um morador de rua em Goiânia, que está na lista dos 33 executados desde agosto do ano passado. O também morador de rua Alessandro Marques Teresa vai responder pela morte de Jorge Coelho dos Santos, assassinado, a facadas, em 8 de dezembro do ano passado, em um depósito de reciclagens, na Vila Boa Sorte.”



Não quero defender ninguém que mata outra pessoa. Nesse caso, porém, algumas perguntas, se fazem necessárias. Faço-as não só em nome pessoal, mas também da Pastoral dos Povos de Rua do Vicariato Oeste da Arquidiocese de Goiânia.



Será que deve ser justamente um morador de rua (Alessandro) – acusado de matar outro morador de rua (Jorge) – o primeiro a ir a júri popular? Será que com isso a Justiça não quer desviar a atenção da sociedade do verdadeiro problema e fazer crer que quem mata os moradores de rua são outros moradores de rua? Será que o morador de rua que matou outro morador de rua – se é que é verdade – não foi “comprado” por alguém para fazer o serviço? Será que não existe um grupo de extermínio que, a mando dos poderosos (considerados pessoas de bem), quer “limpar” a cidade? Enfim, será que a Justiça acha que a população é idiota?



A notícia continua dizendo: “Outros 11 foram executados antes de Jorge, mas ainda não foram julgados. O PM Rogério Moreira da Silva, o Zinca, é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população, mas também não há previsão para o julgamento dele” (Ib., 11/08/13, p. 08).



Pergunto: “Por que esses 11 homicídios, que foram cometidos “antes”, não foram julgados e os assassinos não foram a júri popular?”



O próprio PM Rogério – sempre segundo a mesma notícia – é acusado de praticar três homicídios de moradores de rua, inclusive a primeira vítima da onda de assassinatos contra essa população. Por que ele não foi ainda julgado e não foi a júri popular? Queremos justiça e não maracutaia!




Termino, lembrando que para começar a buscar uma solução à situação desumana em que vivem os moradores de rua, nossos irmãos e irmãs, é preciso implementar – com respeito e amor – uma política baseada na pedagogia libertadora, que leve esses mesmos moradores de rua a serem sujeitos (protagonistas) de sua própria história e não meros objetos da ação assistencial e/ou caritativa do Poder Público, das igrejas e das chamadas “pessoas de bem” de nossa sociedade excludente e hipócrita. A responsabilidade para que isso aconteça é de todos e todas nós.

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